2008

Abril


O PLANEAMENTO FISCAL ABUSIVO
...Com o decorrer do tempo, tem vindo a ser publicada legislação que cada vez mais nos sufoca a nós, TOC''s...


Como todos sabemos, com o decorrer do tempo, tem vindo a ser publicada legislação que cada vez mais nos sufoca a nós, Técnicos Oficiais de Contas, em termos de responsabilização.

Ou talvez não seja tanto assim já que somos, somente, responsabilizados por dois factos. Por tudo e por nada!

É certo que este “trocadilho” tem sido bastas vezes associado a diversas situações com carga humorística mas, Prezados Leitores, a presente abordagem não tem qualquer intuito jocoso, muito antes pelo contrário, servimo-nos dela para reforçar a ideia de que a administração tributária mantém em permanência o desejo de ter “alguém” a quem possam ser exigidas responsabilidades pelo eventual incumprimento dos deveres e obrigações, nomeadamente de cariz fiscal, por parte de contribuintes sujeitos passivos de imposto.

Porém, por termos interiorizado, desde sempre, que para exigirmos devemos, primeiramente, que ser cumpridores, e julgando que é o inverso o que actualmente se passa com o Estado tutelar, isto é, exigem de nós, TOC, aquilo que não é praticado pelo Estado, leva-nos a tecer as seguintes considerações.

Recordando o que escrevemos no editorial do passado mês de Março, sob o título “Fantasmas ou talvez não”, e tendo tomado conhecimento das notícias constantes do caderno “Economia”, do semanário “Expresso”, de 29 de Março, p.º., p.º., que tornaram público que o Estado, através de diversas entidades públicas, tem feito, de há anos a esta parte, aplicações financeiras em paraísos fiscais, nomeadamente Ilha de Jersey, Bahamas, Bermudas, Chipre, Gibraltar, Hong Kong e Antilhas Holandesas, paraísos fiscais estes que constam, todos eles, da lista que integra a Portaria n.º 150/2004, de 13 de Fevereiro, não podemos deixar de ficar incrédulos.

É que, como muito bem refere Nicolau Santos, na sua página (pg. 5) do caderno a que acima fazemos menção, sob o título “E ninguém se indigna?” – “Dez mil milhões de dólares. Era este o montante que, no final de 2006, alguns portugueses tinham aplicados em paraísos fiscais. As seguradoras investiram 9,5 mil milhões e os bancos 4,1 mil milhões. Finalmente, o Estado, através de diversas entidades públicas, também fez aplicações de 235 milhões de dólares.

E continua o articulista – “Ora o que é que alguém que investe em paraísos fiscais pretende? Na melhor das hipóteses, obter uma maior rentabilidade das suas aplicações, dado que não paga os impostos que teria de suportar no seu país de origem...”, e, mais à frente, escreve – “Ora se esse dinheiro tivesse sido aplicado em Portugal, os cofres do Estado receberiam no mínimo um quinto daquele valor. Por isso, parece-me que é mais do que legítimo perguntar se ninguém se indigna com esta situação”.

No mesmo caderno, a páginas 7, da notícia sob a epígrafe “Portugal passou de dois para dez paraísos fiscais em 2006”, respigamos o seguinte: “Fonte oficial garantiu ainda que o Fisco não fica prejudicado por essas operações que, hoje em dia, são frequentes e normais nos mercados financeiros e não são necessariamente ilegítimas ou ilegais”.

Ainda na mesma página, n.º 7, na coluna com a designação Massa crítica, de Luís Marques, é publicado um artigo, que reputamos de muito interessante, sob o título «Estado ‘Off-shore’». Só para que os Prezados Leitores possam aquilatar do interesse que, no nosso entender, o mesmo se reveste, vamos respigar parte do seu primeiro parágrafo – “É estranho que, em 2006, o Estado português tenha investido 235 milhões de dólares em «off-shores». É insólito que o ministro das Finanças tenha justificado estas operações afirmando que elas são «totalmente legais», depois de também ter revelado que elas são «frequentes»”.

Após estas transcrições, atrevemo-nos a solicitar aos Colegas a paciência para lerem, ou relerem, o editorial que escrevemos o mês passado, pois sentimo-nos como que incapacitados para compreendermos afinal o que é o “Planeamento fiscal agressivo ou abusivo” referido no preâmbulo do Decreto-Lei n.º 29/2008, de 25 de Fevereiro.

Ou será que também o Estado português é como Frei Tomás, ou seja faz o que ele diz, não faças o que ele faz... 

Pensamos que se fosse possível ao Ministério das Finanças, à semelhança do que se passa nalgumas competições desportivas, solicitar ao Presidente da República e à Assembleia da República um desconto de tempo para, durante essa pausa (no decorrer da qual não poderiam ser desferidos quaisquer ataques), fosse revista esta, assim como muitas outras situações em que também estamos envolvidos, com a finalidade de se obter um amplo consenso que levasse à eliminação dos excessos e fosse retomado o lema que norteou a reforma fiscal dos anos 80, ou seja, alcançar a equidade através da eficiência, simplicidade e estabilidade, todos nós teríamos a ganhar e, consequentemente, Portugal teria melhores condições para progredir.

João Colaço