Regime Jurídico do Registo Central do Beneficiário Efetivo
De acordo com o disposto nos artigos 5.º e 6.º do Regime Jurídico do Registo Central do Beneficiário Efetivo, aprovado pela Lei n.º 89/2017, de 21 de Agosto, e publicado em Anexo a esta mesma lei, quem tem legitimidade para efetuar a declaração do beneficiário efetivo são os membros dos órgãos de administração das sociedades ou as pessoas que exerçam funções equivalentes noutras pessoas coletivas, note-se que sem prejuízo da legitimidade atrás estabelecida, a declaração do beneficiário efetivo pode sempre ser efetuada pelos membros fundadores das pessoas coletivas através de procedimentos especiais de constituição imediata ou online.
A declaração pode ainda ser efetuada por advogados, notários e solicitadores, cujos poderes de representação se presumem, e também por contabilistas certificados, mas unicamente na decorrência da declaração de início de atividade ou quando estiver associada ao cumprimento da obrigação de entrega da Informação Empresarial Simplificada.
Esta nota introdutória teve a finalidade de alertar os Prezados Colegas que esta obrigação não nos pode ser imputada, a não ser, como acima referido, na declaração de início de atividade ou da entrega da IES.
Começamos, então, por referir que o cumprimento do disposto na Portaria n.º 233/2018, de 21 de Agosto, que veio regulamentar o Regime Jurídico do Registo Central do Beneficiário Efetivo (Regime Jurídico do RCBE), aprovado pela Lei n.º 89/2017, de 21 de Agosto, que procedeu à transposição para a ordem jurídica interna do capítulo III da Diretiva (UE) n.º 2015/849, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 20 de Maio de 2015, relativa à prevenção da utilização do sistema financeiro para efeitos de branqueamento de capitais ou de financiamento do terrorismo, tem suscitado inúmeras dúvidas, pelo que vimos tentar através deste modesto trabalho clarificar um pouco o teor e a finalidade desta legislação.
Permita-se-nos que, ainda antes desse desígnio, deixemos aqui a seguinte nota: O artigo 23.º desta Lei n.º 89/2017, estipulava que a regulamentação prevista no Regime Jurídico do RCBE, aprovado em anexo, é publicada no prazo de 90 dias, a contar do dia seguinte ao da publicação da presente lei, ou seja devia ter sido publicada até 19 de Novembro de 2017, mas só o foi em 21 de Agosto de 2018... Ou seja, certamente que o legislador tem razões que a razão desconhece…
Retomando agora a nossa explanação, começamos por referir que os artigos 3.º e 4.º da Lei n.º 89/2017, estabelecem que os documentos que formalizem a constituição de sociedades comerciais devem conter a identificação das pessoas singulares que detêm, ainda que de forma indireta ou através de terceiro, a propriedade das participações sociais ou, por qualquer outra forma, o controlo efetivo da sociedade, sem prejuízo dos demais requisitos previstos na lei, e que as sociedades comerciais devem manter um registo atualizado dos elementos de identificação: a) Dos sócios, com discriminação das respetivas participações sociais; b) Das pessoas singulares que detêm, ainda que de forma indireta ou através de terceiro, a propriedade das participações sociais; e c) De quem, por qualquer forma, detenha o respetivo controlo efetivo.
Para este efeito os sócios são obrigados a informar a sociedade de qualquer alteração aos elementos de identificação nele previstos, no prazo de 15 dias a contar da data da mesma, podendo a sociedade notificar o sócio para, no prazo máximo de 10 dias, proceder à atualização dos seus elementos de identificação. Note-se que o incumprimento injustificado do dever de informação pelo sócio, após a notificação atrás referida, permite a amortização das respetivas participações sociais, nos termos previstos nos artigos 232.º e 347.º do Código das Sociedades Comerciais.
Alertamos que o incumprimento pela sociedade do dever de manter um registo atualizado dos elementos de identificação do beneficiário efetivo constitui contraordenação punível com coima de € 1 000 a € 50 000.
Outro pormenor a ser tido em atenção, de acordo com o disposto no artigo 37.º, é que sem prejuízo de outras proibições legalmente previstas, enquanto não se verificar o cumprimento das obrigações declarativas e de retificação previstas no presente regime, é vedado às respetivas entidades, nomeadamente, distribuir lucros do exercício ou fazer adiantamentos sobre lucros no decurso do exercício;
A informação constante no RCBE deve ser atualizada no mais curto prazo possível, sem nunca exceder 30 dias, contados a partir da data do facto que determina a alteração. Sempre que possível, a informação respeitante à entidade pode ser atualizada mediante comunicação automática a partir das bases de dados da Administração Pública.
No momento da extinção, dissolução ou cessação, de facto ou de direito, da entidade deve ser cumprido o dever de declaração de todas as alterações ocorridas quanto aos respetivos beneficiários efetivos.
Repare-se que o artigo 30.º do RCBE estipula que são considerados beneficiários efetivos das entidades societárias, quando não sejam sociedades com ações admitidas à negociação em mercado regulamentado sujeitas a requisitos de divulgação de informações consentâneos com o direito da União Europeia ou sujeitas a normas internacionais equivalentes que garantam suficiente transparência das informações relativas à propriedade, as seguintes pessoas: a) A pessoa ou pessoas singulares que, em última instância, detêm a propriedade ou o controlo, direto ou indireto, de uma percentagem suficiente de ações ou dos direitos de voto ou de participação no capital de uma pessoa coletiva; b) A pessoa ou pessoas singulares que exercem controlo por outros meios sobre essa pessoa coletiva; c) A pessoa ou pessoas singulares que detêm a direção de topo, se, depois de esgotados todos os meios possíveis e na condição de não haver motivos de suspeita: i) Não tiver sido identificada nenhuma pessoa nos termos das alíneas anteriores; ou ii) Subsistirem dúvidas de que a pessoa ou pessoas identificadas sejam os beneficiários efetivos.
Note-se que para se aferir da qualidade de beneficiário efetivo, quando o cliente for uma entidade societária, as entidades obrigadas: a) Consideram como indício de propriedade direta a detenção, por uma pessoa singular, de participações representativas de mais de 25 % do capital social do cliente; b) Consideram como indício de propriedade indireta a detenção de participações representativas de mais de 25 % do capital social do cliente por: i) Entidade societária que esteja sob o controlo de uma ou várias pessoas singulares; ou ii) Várias entidades societárias que estejam sob o controlo da mesma pessoa ou das mesmas pessoas singulares; c) Verificam a existência de quaisquer outros indicadores de controlo e das demais circunstâncias que possam indiciar um controlo por outros meios.
Salientamos, assim, que este registo - obrigatório para empresas, fundos e entidades jurídicas de outras naturezas - serve para identificar todas as pessoas que controlam estas organizações e pretende reforçar a transparência, a confiança e a segurança das transações económicas entre as entidades nacionais e internacionais que operam em Portugal. O registo do beneficiário efetivo é obrigatório para todas as entidades constituídas em Portugal ou que cá pretendam fazer negócios.
Frisamos que a declaração inicial do beneficiário efetivo é sempre efetuada com o registo de constituição da sociedade ou com a primeira inscrição no Ficheiro Central de Pessoas Coletivas, consoante se trate ou não de entidade sujeita a registo comercial.
A declaração inicial das entidades sujeitas ao RCBE que já se encontrassem constituídas em 1 de Outubro de 2018, cuja fase teve início em 1 de Janeiro de 2019, deve ser efetuada até ao dia 30 de Junho de 2019, de forma faseada, ou seja, até 30 de Abril de 2019 as entidades sujeitas a registo comercial e até 30 de Junho de 2019 as demais entidades sujeitas ao RCBE.
Posteriormente, de acordo com o estabelecido no artigo 15.º do Regime Jurídico do Registo Central do Beneficiário Efetivo, a confirmação da exatidão, suficiência e atualidade da informação sobre o beneficiário efetivo é feita através de declaração anual, até ao dia 15 do mês de Julho, pelas entidades que devam apresentar a Informação Empresarial Simplificada, juntamente com aquela.
A confirmação atrás mencionada é efetuada através do preenchimento do Quadro Q070201 – Participação no capital social da declarante, do anexo A da IES/DA, cujas instruções de preenchimento referem que neste quadro deve ser indicada a repartição da participação no capital social da entidade declarante, no final do período de tributação a que a declaração respeita (em percentagem), atribuível a pessoas coletivas residentes, pessoas coletivas não residentes, pessoas singulares residentes, pessoas singulares não residentes e outros.
Deve ainda ser inscrita a percentagem de participação direta no capital social e a percentagem de participação direta de direitos de voto, bem como a data de início da mesma, que corresponde à data da primeira participação da entidade declarante. A data de fim da participação apenas deve ser preenchida se a participação se extinguiu no período de tributação em causa.
Este quadro é flexível permitindo, assim, utilizar tantas linhas quanto as necessárias.
No preenchimento deste quadro deve ser tido em conta que não existe nenhum limite mínimo de participação no capital social a partir do qual o quadro é de preenchimento obrigatório. Isto é, devem ser indicadas TODAS as participações diretas no capital social de outras pessoas coletivas.
Finalizamos salientando que, tal como referimos logo de início, a intervenção dos Contabilistas Certificados no RCBE se cinge unicamente à declaração de início de atividade das respetivas entidades e, posteriormente, ao preencher o anexo A da IES/DA, a confirmar a identificação dos participantes no capital da entidade declarante, no final do respetivo período de tributação.
João Colaço