Indemnização por violação do direito a férias
O presente Tome Nota tem o intuito de esclarecer, segundo o nosso entendimento, a diferença do tratamento, no que concerne à sujeição à TSU, do pagamento de férias não gozadas e do pagamento de indemnização por violação do direito a férias.
Assim, sem prejuízo de melhor opinião, geralmente (com algumas excepções, conforme explicitaremos mais adiante) o pagamento de férias não gozadas está sujeito à incidência de contribuição para a segurança social, e o pagamento de indemnização pela violação do direito a férias encontra-se excluído de tal incidência.
Para fundamentar este nosso entendimento vamos socorrermo-nos do que dispõem alguns articulados da legislação laboral e de anotações respigadas de códigos anotados da autoria de eméritos especialistas nestas áreas.
Começamos por recordar que o n.º 1 do artigo 246.º - Violação do direito a férias, do Código do Trabalho (CT), aprovado pela Lei n.º 7/2009, de 12 de Fevereiro, estipula que “Caso o empregador obste culposamente ao gozo das férias nos termos previstos nos artigos anteriores, o trabalhador tem direito a compensação no valor do triplo da retribuição correspondente ao período em falta, que deve ser gozado até 30 de Abril do ano civil subsequente”.
Repare-se, porém, que esta disposição já constava do artigo 13.º do Decreto-Lei n.º 874/76, de 28 de Dezembro, diploma este que veio regulamentar o Regime Jurídico de férias, feriados e faltas, tendo posteriormente passado a constar do artigo 222.º do Código do Trabalho aprovado pela Lei n.º 99/2003, de 27 de Agosto.
Como se verifica não é, de todo, uma matéria nova, pelo que nos causa alguma estranheza sermos ainda questionados, com alguma frequência, se no caso do pagamento de férias não gozadas o procedimento é idêntico ao da situação prevista neste artigo 246.º do CT.
Não podemos deixar de salientar que o n.º 3 do artigo 237.º - Direito a férias, estatui que o direito a férias é irrenunciável e o seu gozo não pode ser substituído, ainda que com o acordo do trabalhador, por qualquer compensação, económica ou outra, sem prejuízo do disposto no n.º 5 do artigo seguinte.
Por sua vez, o referido n.º 5 do artigo 238.º - Duração do período de férias, preconiza que o trabalhador pode renunciar ao gozo de dias de férias que excedam 20 dias úteis, ou a correspondente proporção no caso de férias no ano de admissão, sem redução da retribuição e do subsídio relativos ao período de férias vencido, que cumulam com a retribuição do trabalho prestado nesses dias.
Deve, ainda, ser tido em atenção o disposto nos n.ºs 1 e 2 do artigo 243.º - Alteração do período de férias por motivo relativo à empresa: “O empregador pode alterar o período de férias já marcado ou interromper as já iniciadas por exigências imperiosas do funcionamento da empresa, tendo o trabalhador direito a indemnização pelos prejuízos sofridos por deixar de gozar as férias no período marcado, devendo a interrupção das férias permitir o gozo seguido de metade do período a que o trabalhador tem direito”.
Da obra Novo Código do Trabalho e Legislação Complementar – Anotados, 2.ª Edição, Setembro de 2010, da Ediforum, da autoria do Dr. Abílio Neto, respigamos, de páginas 432, as seguintes anotações ao artigo 246.º do CT:
15. I – A indemnização por violação do direito a férias tem como pressuposto, não só a efectiva ausência de férias, como também a obstrução ao gozo desse direito do trabalhador por parte da entidade patronal. II – Obsta ao gozo das férias do trabalhador a entidade patronal que no período de 1992 a 1997 elabora escalas de trabalho por turnos de uma equipa de quatro trabalhadores, que não contemplavam qualquer período de férias, sendo que as ausências ao serviço de qualquer trabalhador era posteriormente compensada com igual número de horas de trabalho que acrescia ao seu turno normal até perfazer o período de ausência (Ac. RL, de 23.2.2005: Proc. 8980/2004-4.dgsi.Net, e BTE, 2.ª série, n.ºs 7-8-9/2006, p. 904).
16. A indemnização por violação do direito a férias exige que a entidade empregadora tenha impedido o gozo das mesmas, facto que ao trabalhador cabe alegar e provar (Ac. STJ, de 3.3.2005: Proc. 04S4125.dgsi.Net).
20. I – A indemnização pelo não gozo de férias pressupõe que o trabalhador tenha pretendido exercer o seu direito (a férias) e que o mesmo lhe tenha sido negado pela entidade empregadora. II – Verifica-se a violação do direito a férias se na altura que coincidia com gozo de férias do autor, a ré o incumbiu de realizar um estágio com vista à transferência para outra empresa do mesmo grupo económico e, verificada a transferência, o autor não gozou as férias (Ac. STJ, de 19.12.2007: Proc. 07S1931.dgsi. Net).
21. I – O direito a férias é irrenunciável, sendo absolutamente irrelevante, na apreciação da questão da violação desse direito, o facto de o trabalhador não ter exigido, no decurso da execução do contrato, o gozo efectivo de férias. II – O empregador que não inclui o trabalhador no mapa de férias e lhe distribui trabalho todos os dias úteis do ano, cria-lhe um obstáculo incontornável ao gozo de férias (Ac. RL, 9.4.2008. Proc.1466/2008-4.dgsi.Net).
Desta mesma obra, página 423, respigamos as seguintes anotações referentes ao artigo 237.º:
4. O dever de conceder férias decorrente da lei para o empregador e o direito irrenunciável do trabalhador ao seu gozo efectivo revestem-se de um carácter por tal forma vinculativo que nem aquele pode deixar de providenciar no sentido de que este efectivamente as usufrua, nem o segundo pode renunciar a elas, continuando a prestar trabalho àquele (Ac. STJ, de 9.3.1989: TJ, 1.º-149).
5. É nulo o acordo celebrado entre o trabalhador e a entidade patronal no sentido de não serem gozadas as férias, visto que o direito àquelas é indisponível (Ac. RE, de 5.1.1993: Col. Jur.,1993, 1.º-289, BMJ, 423.º-624, e BTE, 2.ª série, n.ºs 7-8-9-/95, pág. 754).
7. Ao trabalhador incumbe apenas provar, de harmonia com o preceituado no art. 342.º, n.º 1, do Cód. Civil, que trabalhou sob as ordens, direcção e fiscalização de outrem, durante o lapso de tempo exigido por lei para que se vença o direito a férias, recaindo sobre a entidade patronal o ónus de provar que aquele as gozou e que lhe pagou a retribuição correspondente (Ac. RL, de 7.12.1994: BMJ, 442.º-248).
Analisemos, agora, a questão se a indemnização em epígrafe está ou não sujeita a incidência contributiva em sede de segurança social.
De acordo com o disposto na alínea a) do n.º 1 do artigo 48.º - Valores excluídos da base de incidência, do Código dos Regimes Contributivos, os valores compensatórios pela não concessão de férias ou dias de folga, não integram a base de incidência contributiva.
De modo a explicitar com mais clareza a razão de ser desta exclusão, vamos socorrermo-nos da obra Código dos Regimes Contributivos do Sistema Previdencial de Segurança Social – Anotado – edição da Vida Económica, da autoria do Dr. Albano Santos, Advogado – Especialista em Direito no Trabalho, da qual respigamos, da página 82, a seguinte nota à suprareferida alínea a) do n.º 1 do artigo 48.º :
“O art.º 48.º, à semelhança do art.º 3.º do Decreto Regulamentar n.º 12/83, revogado pelo Código, refere as prestações que não entram na base de incidência contributiva, louvando-se o aditamento de certas prestações que não constavam do já citado art.º 3.º do Decreto Regulamentar n.º 12/83 e que eram consideradas isentas de TSU, embora sem uma base legal concreta que o determinasse. Louva-se a clarificação da lei.
Dito isto, importa clarificar algumas das prestações que não se incluem na base de incidência, particularmente aquelas cuja interpretação pode suscitar dúvidas.
Alínea a). Estão aqui previstos os valores pagos ao trabalhador em compensação da não concessão de férias, cujo gozo foi impedido pelo empregador, nos termos do art.º 246.º do Código do Trabalho.
Na verdade, as férias devem ser gozadas no ano civil em que se vencem, podendo, no entanto, ser ainda gozadas até 30 de Abril do ano civil subsequente, por acordo entre empregador e trabalhador, nos termos do art.º 240.º do Código do Trabalho. E, não sendo gozadas nestes termos, por culpa do empregador, que impediu o seu gozo, o trabalhador tem direito a receber uma compensação correspondente ao triplo da retribuição das férias cujo gozo foi obstado. Ora, esta compensação do direito a férias não gozadas não é considerada retribuição, tendo antes carácter compensatório, e, por isso, não está sujeita a incidência contributiva. Já o valor da retribuição das férias, que terão de ser gozadas (ou pagas), assim como do subsídio de férias, está sujeito a incidência contributiva.
Não está, pois, aqui prevista a retribuição por férias vencidas e não gozadas ou a retribuição correspondente a férias proporcionais ao período de trabalho prestado no ano da cessação do contrato de trabalho, nos termos do art.º 245.º, n.º 1, do Código do Trabalho. Tais remunerações estão, e sempre estiveram, incluídas na base de incidência, como se referiu em anotação à alínea g) do n.º 2 do art.º 46.º.”
A anotação atrás referida consta da página 65 da supramencionada obra, e que passamos a transcrever, dado o evidente interesse da mesma.
“Remuneração das férias
Durante o gozo das férias o trabalhador deve auferir uma retribuição correspondente àquela que receberia se estivesse em serviço efectivo – Cfr. Art.º 264.º, n.º 1, do Código do Trabalho.
Ora a remuneração correspondente ao período de férias, ainda que se trate da retribuição correspondente a férias não gozadas ou ao direito a férias proporcionais ao trabalho prestado no ano da cessação do contrato de trabalho, entra na base de incidência contributiva para a segurança social.
Inclui-se aqui a remuneração das férias vencidas no ano da cessação do contrato de trabalho, ainda não gozadas à data da cessação do contrato, a que acresce a remuneração correspondente a um período de férias proporcional ao período trabalhado nesse mesmo ano, nos termos do disposto no art.º 245.º, n.º 1, do Código do Trabalho.”
Recordamos aos Prezados Colegas que referimos, no 2.º parágrafo da parte inicial deste Tome Nota, que existem situações em que o pagamento de férias e, ou, folgas, não gozadas, não estão sujeitas a incidência de contribuições para a Segurança Social.
Para explicitarmos algumas destas situações permitimo-nos respigar, agora da página 11/15 do Guia Prático – Declaração de Remunerações, versão de 10 de Abril de 2015, da Segurança Social, a seguinte nota:
“Valores compensatórios pela não concessão de férias ou de dias de folga (por exemplo: casos em que a entidade empregadora, por motivos de acréscimo de trabalho, não pode autorizar todos os dias de férias ou folgas a que o trabalhador tenha direito, neste caso, o trabalhador é compensado em dinheiro, no entanto, esses valores não sofrem descontos para a Segurança Social), sendo, pois, excluídos da base de incidência contributiva.”
Estamos crentes que o entendimento expresso no inicio deste Tome Nota pode ser resumido do seguinte modo. Se o pagamento de férias não gozadas tiver natureza de indemnização (de cariz compensatório), não é considerado na base de incidência de contribuições para a Segurança Social. Se o pagamento for devido ao facto de o trabalhador já não as poder gozar, nomeadamente por o respectivo contrato de trabalho ter cessado, então estará sujeito à contribuição para a Segurança Social. Note-se que tanto num caso como no outro os correspondentes subsídios de férias estarão, sempre, sujeitos a Segurança Social
Esperamos que o presente trabalho tenha um mínimo de utilidade para os Prezados Colegas, e que o mesmo seja alvo das vossas críticas e ou sugestões.
João Colaço